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quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Governo e a Igreja-Instituição católica: a dissimulação

Joaquim Pacheco de Lima*
POITICA. Há uma inflexão entre o Governo Dilma e a Igreja-Instituição católica. Em entrevista a Folha de São Paulo, 19.01.2011 (abaixo), o Arcebispo de Brasília, aponta que para o diálogo é preciso que a presidenta explicite suas convicções religiosas. A postura de Dom João de Aviz, [conheço-o desde os idos de 1980 na diocese de Apucarana-PR, nos estudos filosófico e teológico] e continua com a mesma visão de homem, mundo e sociedade, neotomista, referenciado na teologia fenomenológica europocêntrica. A sua referência política – poder - é a da terceira via, a democracia cristã. Tal corrente política restou o fracasso nas experiências postas (Itália, Espanha, Portugal, Alemanha, Grécia, etc). O ex-coordenador de pastoral apucaranaense não é um dogmático, mas tem a missão de estabelecer o diálogo Estado-Igreja sem provocar conflito explícito. Defensor da ‘desigualdade’ como ordem natural da sociedade, a prédica nega, por isso, incumbe-lhe o papel de distender conflito ideológico com o pensamento marxista (PT, PC do B e a plêiade de correntes) dissimulando neutralidade, mas também delimitando campo para evitar que os seus próceres alie-se a corrente oponente, inimiga. O apoio do parlamentar Gabriel Chalita (PSDBS-SP), por razões particulares da política, a campanha da presidenta Dilma acendeu o farol. Noutro campo, quer demarcar e esconder a aproximação com a social-democracia (PSDB). Faz jogo de movimento (gramsciano) com setores do petismo no governo (o ‘igrejeiros’ da antiga corrente Articulação).
A aproximação política da Igreja Universal com o Governo Dilma é notório – por meio da TV Record no embate ideológico. A TV do pastor Edir Macedo, inimiga da TV Globo e da Folha abre espaço para de defesa dos atores e idéias governamentais, contrapondo os seus inimigos na campo da mídia. Por outro lado, setores da Pastoral Social da Igreja Católica e os movimentos sociais aproximados (CPT-CIMI, Movimentos de Barragens, mulheres, setores do MST, Direitos Humanos e outros) fomentam rusgas no campo pragmático do realismo político x princípios matriciais partidário socialismo – utopia.
O arcebispado de Brasília, desde a ditadura e na redemocratização, assumiu postura de defesa da ordem e do pensamento conservador. Considerando a complexidade econômica, cultural e política da sociedade brasiliense, ou dos candangos a identidade da Igreja como ‘capelã dos militares’ não respondia mais a demanda pela nova identidade simbólica religiosa. Para encurtar o diapazão Igreja-mundo, Igreja-sociedade e mediar as relações com o poder-central a Santa Sé escolhe a dedo um de seus colaboradores para tal tarefa.
A tentativa de aplicação dos princípios e valores cristãos (solidariedade, partilha, equidade, igualdade, etc.) na vida política nacional e internacional como mimetização do liberalismo, que tem como matriz a propriedade privada e o mercado, escondem uma manipulação grosseira dos elementos religiosos para fins econômico e interesses políticos das classes dominantes. Na ideologia as idéias não podem explicitar contradições.
O sistema capitalista e globalizado pode aparecer envolto de um ‘aroma religioso’ e sua capacidade de produzir e reproduzir mais valia, classes sociais, também produz e reproduz seu próprio universo simbólico, sua espiritualidade, e sua religião. Capaz as contradições e dissimulações é papel da hermenêutica, da ciência, da filosofia e da teologia.
Na gênese do Capital está a morte, no Deus de Jesus de Nazaré está a Vida em abundância. Conciliar, mimetizar tal antagonismo somente com dissimulação.
*professor de filosofia e sociologia. Colaborador da CPT – junto ao Regional da CNBB-Sul II de 1984-1994.



DILMA PRECISA EXPLICAR SUAS CONVICÇÕES : entrevista com o arcebispo de Brasília – Dom João de Aviz

Folha de São Paulo. 19.01.2011.
Alçado repentinamente à condição de um dos principais nomes da Igreja Católica no mundo, dom João Braz de Aviz, arcebispo de Brasília, afirma que a presidente Dilma Rousseff (PT) precisa explicar melhor o que pensa a respeito de certos assuntos caros à igreja.
"Não temos uma ideia clara de quem é Dilma do ponto de vista religioso. Ela precisa explicar melhor as suas convicções religiosas para que o diálogo possa progredir."
Arcebispo de Brasília comandará um dos 'ministérios' do Vaticano
Segundo Aviz, 63, as posições sobre o aborto que Dilma expressou durante as eleições não necessariamente representam o que acontecerá sob seu governo: "Durante a campanha é uma coisa, e na prática o caminho às vezes é outro".
No dia 4, a igreja anunciou que o papa Bento 16 nomeou dom João prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica.
Ele deve assumir o cargo, um dos nove "ministérios" da Igreja Católica, em fevereiro.

Na entrevista a seguir, Aviz também comenta o crescimento das igrejas evangélicas e critica o fato de algumas denominações terem "compromisso fortíssimo com a arrecadação de dinheiro".
Folha - Qual a sua avaliação a respeito do debate sobre o aborto durante as eleições?
João Braz de Aviz Foi um pouco ruim, porque a discussão dos bispos e de pessoas leigas ligadas à igreja apareceu com a exclusão de um partido [o PT]. Ou seja, havia uma definição de posição político-partidária muito clara [a favor do PSDB], e a Igreja Católica não sustenta isso.
Do outro lado, o que está à flor da pele é que uma imensa parte da população brasileira não aceita essa enxurrada de propaganda a favor do aborto que é feita de modo impositivo. Há um movimento de legalizar o aborto e considerá-lo um direito humano, o que é uma coisa muito difícil de a gente compreender.
Portanto, a posição dos bispos até estava correta, mas o que houve de dificuldade foi identificar apenas em um partido essa posição e aproveitar esse fato para uma escolha política.
No geral, o sr. considera que as eleições correram bem?
O que se viu foi sobretudo um processo político muito maduro. O crescimento de um terceiro elemento [o PV, de Marina Silva] que não se identifica com as duas principais forças me parece muito positivo. Há um crescimento da consciência política e do diálogo democrático.
O sr. imagina que a igreja terá alguma dificuldade de diálogo com o governo Dilma?
Claro que a gente sempre espera que o diálogo seja muito bom. Mas a verdade é que não temos uma ideia clara de quem é Dilma do ponto de vista religioso. Ela precisa explicar melhor as suas convicções religiosas para que o diálogo possa progredir.
O que sabemos é que Dilma mostrou flexibilidade com relação a temas importantes para a igreja. Mas também sabemos que políticos fazem isso: durante a campanha é uma coisa, e na prática o caminho às vezes é outro.
O que o sr. espera dela com relação a isso?
Eu espero que as posições dela se aproximem das posições da igreja. Para isso, precisamos conhecer melhor o que pensa a Dilma presidente em relação a certos temas.
Não só o aborto, que teve destaque na disputa eleitoral, mas também quanto ao PNDH-3 [Plano Nacional de Direitos Humanos], que traz posições contudentíssimas para a igreja. Há aspectos muito bonitos com relação à questão social, mas temos aborto, homossexualismo, um monte de coisa que precisamos ver como vai ficar.
Eventuais diferenças não inviabilizariam o diálogo?
Para que exista um bom diálogo, é fundamental que ela diga exatamente o que pensa para podermos avançar a partir daí. O fundamental é dar ao outro a oportunidade de ser ele mesmo, para o diálogo continuar. Se a posição dela for outra, tenho direito a uma atitude diferente.
Até o momento, não sabemos como será, pois ela assumiu a posição do ex-presidente Lula, que é impossível moralmente. Ele diz que tem uma posição pessoal como homem de fé e outra como presidente, como homem de Estado. Ora, a gente tem apenas uma moral, e não duas.
Muitas igrejas têm bancada no Congresso. Qual sua opinião sobre a separação entre religião e política e a possibilidade de mistura entre os dois campos?
A separação entre igreja e Estado foi uma conquista e representa uma grande vantagem democrática em relação ao passado, quando havia a imposição da religião sobre o Estado.
O problema é que muitas vezes não fica claro se estão usando a afirmação do caráter laico do Estado para dizer que ele é ateu e que o cidadão religioso não tem lugar na discussão política. Aí já é complicado, porque é preciso haver liberdade religiosa e respeito a essas posições.
Esse equilíbrio é que ainda não apareceu, e o debate acaba sendo recheado por posições já tomadas de antemão.
Mas não podemos considerar que a experiência religiosa esteja reduzida apenas à dimensão da consciência ou à dimensão pessoal, como se não tivesse nenhuma função social. Por isso é que a Igreja Católica está recuperando a atenção à política.
Como o sr. vê o forte crescimento das igrejas evangélicas, em especial entre as classes mais baixas?
Muitos desses movimentos religiosos mais modernos não exprimem uma fidelidade à doutrina do Evangelho como ela é --escolhem apenas partes e, às vezes, assumem compromissos com coisas que não são corretas. Por exemplo, há igrejas que têm compromisso fortíssimo com a arrecadação de dinheiro.
Por que essas igrejas têm tido mais êxito entre os pobres do que a Igreja Católica?
Não sei dizer uma razão particular. Sei que, hoje, essas igrejas usam os meios de comunicação de maneira muito forte, com motivações psicológicas... Isso tem uma força sobre as pessoas, que têm uma dimensão religiosa grande no coração.
Mas a Igreja Católica não segue essa estrada. Há muito de proselitismo por trás [de outras igrejas], não só de verdade. E nosso caminho [da Igreja Católica] não é o proselitismo, é o testemunho.
O sr. poderia citar alguma em particular?
Prefiro não citar nenhuma. O importante é mencionar o fenômeno. As pessoas sabem que isso existe.

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